"Buruburu" (2010), Ayrson Heráclito (Foto: Cortesia do artista)
Pelo Pavilhão

As performances da SP-Arte 2020

Marcos Gallon
27 fev 2020, 10h24

Atenção: a SP–Arte 2020 foi cancelada devido à pandemia de COVID-19. Em breve, confira novidades sobre a 17ª edição do Festival Internacional de Arte de São Paulo.

Acima: "Buruburu" (2010), Ayrson Heráclito (Foto: Cortesia do artista)

Pelo terceiro ano consecutivo, corpos, movimentos e práticas aparecem combinados no setor Performance da SP-Arte 2020.

Elaborado como uma jornada entre corpos, o programa de performance da SP-Arte 2020 busca afirmar a potência catalisadora do gesto, evidenciando os rastros deixados pelos corpos de Ayrson Heráclito (Portas Vilaseca Galeria, RJ), Carla Borba (OÁ Galeria, Vitória), Elilson (Vermelho, SP), Élle de Bernardini (Luciana Caravello, RJ), e Marco Paulo Rolla (Verve Galeria, SP) no espaço.

Imagens, objetos, textos, linhas e traços constituem, nesse contexto, um levantamento de gestos marcados por movimentos involuntários, desestruturados e reparadores. Poéticos e por vezes patéticos, realizados solitariamente, em grupo ou com a participação do observador.

Por meio de práticas distintas, as cinco ações exploram as possibilidades que se abrem no cruzamento entre o semelhante e o diverso, entre a matéria e o espírito, entre a repetição e o único, entre a tradição e a vanguarda, entre a alienação e a participação, apontando, a partir dos vestígios que sobrarem no espaço, para a “fragilidade do estado instável em que tal experiência nos lança”, como afirma Suely Rolnik.

Revisando formas e experiências com procedimentos que escapam da ditadura da eficiência e da técnica pura, desviando gestos de sua função habitual ou privando-os inteiramente dela, as cinco ações contribuem para a inserção de corpos no circuito da arte, em um espelho fragmentário de pensamentos – é isso que esse conjunto de ações quer ser.

Integrado ao eixo principal da SP-Arte 2020, as proposições desses cinco artistas enriquecem o repertório gestual das obras expostas neste Pavilhão, atestando a virada performativa da arte que revolucionou não apenas as maneiras pelas quais o artista faz arte, mas também as maneiras pelas quais as obras de arte são expostas e experimentadas pelo observador.

"Buruburu" (2010), Ayrson Heráclito (Foto: Cortesia do artista)

"Buruburu" (2010), Ayrson Heráclito (Foto: Cortesia do artista)

Ayrson Heráclito
“Buruburu”, 2010, 60’

Galeria Portas Vilaseca
Rio de Janeiro, Brasil

Buruburu significa pipoca no dialeto afro-brasileiro. No candomblé a pipoca está ligada a Obaluaê, o orixá da doença e da cura. São as flores brancas que pipocaram de suas feridas por isso ficou conhecida, pelo povo de santo, como a Flor do Velho. Assim, a performance evoca questões rituais de cura e de limpeza do corpo físico e espiritual, através de um banho de pipocas.

Se todos os trabalhos de Heráclito giram em torno da questão do corpo negro, seus mitos e lendas diante de uma história que quis invisibilizá-lo, “Buruburu” parece ser o que mais dá espaço para as práticas espirituais, ressaltando o aspecto imaterial que compõe uma cultura por meio do ritual de purificação. A chuva de pipoca – em sua leveza e beleza – fala de práticas tradicionais que sofreram um processo de apagamento à sombra da legitimidade da cultura do colonizador.

Datas e horários: 1º de abril, 12h; e 2 de abril, 14h
Local: Pavilhão da Bienal, Térreo
Estande: SL 04

"7 cabeças" (2003-2020), Carla Borba (Foto: Rafael Pagatini)

"7 cabeças" (2003-2020), Carla Borba (Foto: Rafael Pagatini)

Carla Borba
“7 cabeças”, 2003-2020, 60’

Com: Bruna Kury, Jessi, Katia Salvany, Lívia Dávalos, Paola Ribeiro, Raylander Mártis dos Anjos, Suelen Calonga e Carla Borba. Apoio: Carina Dias

OÁ Galeria
Espírito Santo, Brasil

A ação consiste no encontro de mulheres e na partilha estabelecida por elas a partir do jogo infantil “escravos de Jó”. A performance-protesto se estrutura como uma plataforma de estudo e debate sobre as relações entre arte, política e questões de gênero.

Em “7 Cabeças” as participantes carimbam papéis, leem textos críticos, debatem e bebem cachaça enquanto jogam e cantam. Notícias e depoimentos sobre a vida da mulher na sociedade são compartilhados, o que gera atravessamentos no canto e muda o ritmo da ação – ora mais violenta, ora mais tranquila.

O público é convidado a entrar no jogo. As normas podem ser revistas e subvertidas pela influência da cachaça. O riso e a alegria tornam a performance uma experiência de subjetivação.

Datas e horários: 1º de abril, 19h
Local:
Pavilhão da Bienal, 2º andar
Estande: A 14

"Fa(r)dado"(2018), Elilson (Foto: Renata Vieira)

"Fa(r)dado"(2018), Elilson (Foto: Renata Vieira)

Elilson
“Fa(r)dado”, 2018, Duração variável

Galeria Vermelho
São Paulo, Brasil

Diariamente, durante a SP-Arte 2020, envelopes vermelhos serão jogados do mezanino do terceiro andar do Pavilhão, reencenando a ação Fa(r)dado, de Elilson, realizada pela primeira vez em 13 de dezembro de 2018, dia em que se recordavam os cinquenta anos da emissão do Ato Institucional n° 5, o AI-5.

No envelope, um texto impresso e um cartão espelhado com frase serigrafada constituem dois arquivos que, embora separados por cinco décadas, refletem a proximidade entre a ditadura militar e o Brasil atual.

Datas e horários: 1º de abril, 11:30h; 2 de abril, 15h; 3 de abril, 20h, 4 de abril, 17h; e 5 de abril, 18h
Local:
Pavilhão da Bienal, 3º andar
Estande: K 06

"Campo de Contato II" (2016), Élle Bernardini (Foto: Cortesia da artista)

"Campo de Contato II" (2016), Élle Bernardini (Foto: Cortesia da artista)

Élle de Bernardini
“Campo de contato II – Tapas para que te quero?”, 2016, 60’

Luciana Caravello
Rio de Janeiro, Brasil

Estapear ou não estapear?

O impasse criado por “Campo de contato II – Tapas para que te quero?” é de ordem moral. Jovens e adultos, uma vez dentro do espaço do evento, tornam-se participantes, ouvintes e público, sendo arremessados para dentro de uma esfera de ação moral, ou seja, passam automaticamente a ser responsáveis pelo decurso da ação.

Assim, eles se veem enlaçados na questão de dar o tapa e participar, realizar a obra enquanto arte, questionando o estatuto moral da beleza como valor comparativo ao bom e ao bem, ao inalienável, ou de não dar o tapa e a obra não acontecer.

Há, sem dúvida, um momento de instauração de tensão, entre arte e vida, num fundo de crueldade, como queria Artaud, e a performance sabe bem evocar tal momento. Todo o curso do ritual atravessado por uma atmosfera de incerteza, ambiguidade e dúvida moral.

Datas e horários: 1º de abril, 12:30h; 2 de abril, 16h; 3 de abril, 19h, 4 de abril, 18h; e 5 de abril, 16h
Local:
Pavilhão da Bienal, 2º andar
Estande: J 05

Marco Paulo Rolla
Espectros da série “Transmutações”, 2020
Ação inédita, 60’

Verve Galeria
São Paulo, Brasil

Na ação, Marco Paulo Rolla ativará o espaço por uma hora, diariamente, utilizando carvão – que é o elemento básico que integra todos os corpos.

Com carvão, o artista desenhará no espaço, chão e paredes, rastros e contornos de sua presença. Ele repetirá a situação sobrepondo os desenhos-espectros de seu corpo uns sobre os outros, criando uma obra em progresso.

A ação conta ainda com uma máscara feita em gesso do rosto do artista que revela o caráter escultórico e instalativo que permeia suas ações. Por meio desses procedimentos, a ação vem fazer referência às diversas camadas da existência humana, visíveis e invisíveis, que serão ativadas através do complexo de imagens criadas pela presença do corpo, sua imagem, sua reverberação e reprodução.

Datas e horários: 1º de abril, 13h; 2 de abril, 17h; 3 de abril, 18h, 4 de abril, 19h; e 5 de abril, 16h.
Local:
Pavilhão da Bienal, 2º andar
Estande: A 09


Marcos Gallon

Marcos Gallon é formado em Filosofia pela PUC São Paulo. Como bailarino e coreógrafo, trabalhou em várias companhias de dança em São Paulo e na Alemanha. Em 2003 e 2004, criou o projeto coletivo Corpo de Baile, e é diretor artístico da Verbo – Mostra de Performance Arte, plataforma anual de performance arte, criada pela Galeria Vermelho.

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