O arquiteto Jaime Lerner apresenta pela primeira vez sua linha de móveis de aço carbono na SP-Arte

7 mar 2019, 10h03

Por Regina Galvão

 

Habituado a planejar cidades há cinco décadas, Jaime Lerner, o mais premiado urbanista do país e um dos mais influentes do mundo, responde com objetividade ao ser questionado sobre o recente desejo de projetar móveis: “É apenas uma vontade de fazer coisas novas”.

A simplicidade da resposta se estende ao conceito do mobiliário, cuja inspiração se baseia nos preceitos do wabi-sabi, expressão japonesa com origem no zen-budismo que valoriza a beleza da imperfeição – algo que o arquiteto faz questão de perseguir desde quando se tornou prefeito de Curitiba, em 1974. Naquela época, sem recursos para investir em linhas de metrô, ele inventou o BRT, sigla em inglês para Bus Rapid Transit, um sistema de transporte público com canaleta exclusiva que torna o desempenho do ônibus na superfície tão eficiente quanto ao do trem no subterrâneo.

A façanha, entre outras de suas gestões como prefeito de Curitiba por três vezes e governador do Paraná em duas ocasiões, levou-o a ser reconhecido internacionalmente, com vários prêmios, palestras em diversos palcos mundiais, e a adoção de seu modelo viário em aproximadamente duzentas cidades do planeta.

Saindo da escala macro à micro, Jaime Lerner, aos 81 anos, se prepara para apresentar a coleção de móveis na próxima edição da SP-Arte – de 3 a 7 de abril, no Pavilhão da Bienal. São cinco peças desenvolvidas em parceria com a arquiteta Samira Barakat, sócia na Jaime Lerner Design. O escritório foi fundado em 2015, no mesmo endereço do Jaime Lerner Arquitetos Associados, cuja sede fica na casa em que o renomado urbanista viveu a maior parte de sua vida com a mulher e as duas filhas, no bairro de Juvevê, na capital paranaense.

Sobre sua participação no setor Design do Festival de Arte Internacional de São Paulo, Lerner garante não ter grandes expectativas. “Quero apenas mostrar o bom design: móveis práticos, bonitos, duráveis e sem grandes frescuras. Móveis dos quais as pessoas possam usufruir com prazer em suas casas ou em áreas públicas”, ressalta.

Essa não será a primeira vez que ele exibe o mobiliário assinado. A estreia aconteceu em 2016 com a namoradeira Duo, fabricada para o Projeto Viés, selo criado pelos designers Ronald Sasson, Zanini de Zanine e Flávio Franco com a intenção de valorizar o design autoral brasileiro.

O convite ao arquiteto partiu de Sasson, amigo de uma das filhas de Lerner e autor de itens premiados no Brasil e no exterior. “Ao visitá-lo no escritório, descobri que ele já tinha uma série própria de móveis em maquetes, produzidas em chapa de alumínio”, recorda-se o designer. “Ele topou fazer parte do nosso grupo e me deu liberdade para produzir a peça que quiséssemos. Acabamos optando pela namoradeira.”

Apesar das linhas minimalistas, a execução da Duo requereu muita habilidade. A namoradeira, cuja forma se assemelha a um grande S, foi inicialmente pensada em aço carbono, mas por fim confeccionada artesanalmente em chapas dobradas de ferro nos dois sentidos por uma empresa no Piauí. O lançamento ocorreu em Curitiba, onde o exemplar foi leiloado em prol de uma instituição de caridade.

No mesmo ano, Lerner lançou a chaise-longue Urca, uma homenagem ao Rio de Janeiro, e fabricada de fibra de vidro com estrutura de aço carbono pela empresa paranaense Artesian. “Enxergo um traço de época em seu desenho, contínuo e ritmado, como era também o de Oscar Niemeyer. As estações de ônibus em formato de tubo projetadas para Curitiba são exatamente isso: um traçado simples de uma chapa de aço com rasgos de vidro”, comenta Ronald Sasson.

O metal, onipresente na obra urbana, também é a matéria-prima favorita na hora de pensar o mobiliário. “É um material de simplicidade extrema, que possibilita criatividade, rapidez e dobraduras, e eu gosto muito de dobrar”, explica Lerner.

Na atual coleção, chapas de aço carbono, cortadas e dobradas por uma metalúrgica de Curitiba, dão forma ao balanço Lua Turca, à poltrona M e aos bancos W e Toin oin oin – esse último pintado de vermelho Ferrari, como ele gosta de frisar.

Única e original, a produção de Jaime Lerner não se esgota nessas novidades. Segundo Samira Barakat, há de dez a vinte móveis ainda a serem lançados. “Sempre que eu encontro Jaime no escritório, ele tem um papel ou um guardanapo com o desenho de uma nova peça para me mostrar”, diz a sócia, que conta ainda sobre a intenção de levar mais um item para a SP-Arte, além dos cinco já previstos. O nome e o tipo de móvel, no entanto, ela se nega a revelar.

 


Regina Galvão é jornalista formada pela Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero, com pré-MBA em Marketing pela Universidade da Califórnia em San Diego (UCSD) e pós-graduação em História da Arte pela Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), em São Paulo. Como editora, trabalhou em revistas como Casa Claudia, da Abril, e Casa Vogue, da Globo Condenast. Em 2018, participou da equipe de curadoria da mostra Brazilian Stones, Original Design, coordenada por Adélia Borges na Vitória Stone Fair, em Vitória, e foi curadora das exposições MoMA Design – Acervo Fiesp (2017), no D&D Shopping; Pensamento Circular (2014), no Museu da Belas Artes (Muba); entre outras.
Setor Design
Nesta 15ª SP-Arte, o setor Design chega a sua quarta edição. Voltado a mobiliário, iluminação e antiquário, o setor reúne os principais designers do país. Em 2019, destaque para um núcleo voltado à produção de mobiliário por arquitetos, que reúne peças de Jaime Lerner, Paulo Mendes da Rocha, Arthur Casas, entre outros.

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